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Seu Zé

Julinha tinha penas 7 anos de idade naquela época, ela e seus outros 6 irmãos estavam brincando de polícia e ladrão. Eles corriam e pulavam na lama enquanto sua mãe plantava feijão. Enquanto Raimunda cavava os buracos e ponhava os feijões, Renato, seu filho mais novo, se aproximou gritando que Julinha tinha entrado em um lago e foi picada por uma cobra. Raimunda saiu correndo para ajudar a filha, mas quando chegou já havia se formado um pequeno poço de sangue ao redor do pé da menina. Raimunda arreganha os olhos assustada de preocupação com o que via. Isso não foi uma cobra que a picou. Primeiro ela arrancou um pedaço de tecido do vestido da Julinha e estancou o sangue. Depois jogou água para tentar ver a profundidade do corte. Raimunda percebeu que corte foi causado por um pedaço de vidro que estava jogado no lago. O corte era muito profundo e havia atingido uma veia, por isso Julinha perdeu tanto sangue. Aquele ano era 1979, na zona rural do sertão do interior do Ceará. O acesso à um...

Para me lembrar

Hoje estou com o coração despedaçado Me lembrei de nós dois Mas não posso me deixar enganar pela saudade Não posso me esquecer de suas mentiras Não posso deixar a saudade camuflar seus abusos A última coisa que você me falou foi: menti porque tenho medo das suas pressões Mas quantas mentiras você já inventou durante nosso relacionamento? Das que descobri, inúmeras Das que desconfiei e você me driblou me fazendo acreditar no contrário, mais do que as que eu descobri Naquele dia de mentiras, o último dia, me veio esse insight Tudo que vivemos foi fruto do seu g aslighting Você me fez duvidar da minha sanidade Lembro-me do dia que bebias do meu lado e, ao telefone, tentava comer a Maiara Eu vi que era ela, mas me convenceu que não, mesmo eu vendo que era E acreditei Depois de tantos anos, aprendi a entender sua forma de agir Me aperfeiçoei em ler você, sua fala mansa quando está mentindo, sua cara sínica, sua sedução para me distrair Sua cara que não treme ao inventar versões muito mal el...

Me acolho

Eu me acolho Acolho minhas fragilidades Minhas escolhas ruins Acolho todas vezes que me submeti as situações de abusos Meus medos E quando por dependência emocional escolhi ficar Acolho meu erros Minhas covardias Eu me acolho Porque todos esses issos São frutos da minha erê que não foi acolhida em suas fragilidades E porque, sem duvidas, precisei vivenciar esses traumas e angústias para perceber que sou mais forte Não consigo me imaginar dessa forma sem antes não passar por isso E me alivio de quem sou hoje Da forma como vejo o mundo agora Deus me livre de ser de outra forma Já não penso que preciso de alguém que me salve de me afogar Mesmo agora que vivencio a pior decepção amoroso da minha vida Estou finalmente feliz por estar onde estou Não que eu não sofra por ti, meu amor Eu te amo Mas te quero longe de mim E lamento por isso Mas estou melhor sem você E sofro, sinto saudades e choro, não minto Você me deixou mais forte, mas não escolhi isto Mas agora escolho ficar sem você Porque ...

Encontro com o eu criança

Em uma tarde de dezembro de 2024, Raimunda se encontrava no sertão do Ceará, na localidade onde nasceu. Ela viajou horas de avião para passar o natal e as férias em família. Naquela época do ano, as casas de seus familiares ficavam agradáveis e ao mesmo tempo sufocantemente cheia. Raimunda gostava de psicoativos para relaxar as vezes, e naquele dia a casa que ficava ao fundo da residência de sua avó estava vazia, uma casa sem móveis e apenas uma rede. Ela aproveitou aquele momento para fumar uma erva. Deitou na rede o pegou a ceda e a piteira, dichavou o prensado, colocou na ceda e bolou tranquilamente. Olhou no relógio, eram 16h20. Acendeu o baseado com seu isqueiro rosa. A lombra bateu na hora, o vento seco do sertão batendo de leve em seu rosto e ele grunhia feito um gigante soprando. O ferro que segurava a rede reclamava do balanço por falta de óleo. Fechou os olhos e apreciou aquele momento raro. Raimunda não sabe quantas horas ficou se balançando antes do diálogo com a sua Erê de...

À meus poemas

Tô cansada dos meus poemas  Cansada da mesma ladainha À anos escrevo sobre a mesma pessoa Os mesmos abusos O mesmo encantos e desencantos Meus poemas mais parecem um grito mudo de socorro  São degradantes, uma verdadeira vergonha alheia. Tô cansada dos meus poemas Cansada da monotonia sobre mim mesma À anos escrevo sobre meu espelho As mesmas sabotagens A mesma atitude de culpabilizar os outros por meus fracassos  Meus poemas mais parecem um esgoto Descartados minhas fezes, um verdadeiro fedor. Tô cansada dos mesmos poemas  Cansada da minha covardia  À anos escrevo sobre quão me submeto a situações de abuso por medo de sair da minha zona de conforto As mesmas submissões  Meus poemas mais parecem uma literatura do século xix São massivos, sempre o mesmo vitimismo.

fronteira

Deslizo a cadeira de plástico até à varanda E com ela um barulho estressante para quem está do lado Devido o atrito dos dois pés da cadeira com a cerâmica  Em minha mão direita um cigarro  Na esquerda um capulho bolado Sento pendurando minhas pernas na proteção de ferro da varanda E acendo o cigarro olhando para a avenida barulhente, como minha mente E desfruto del Paraguay Avistando do Brasil Um privilégio dedicado também a uma proletariada como eu  Mas o privilégio de morar de frente para outro país é de poucos  Em fim acendo o capulho E a fumaça desliza em meus pulmões  Organizando minha mente  Me permitindo viajar sem sair do lugar Com vista para Cidade Del Leste  Que descansa do comércio caótico do dia Penso que tenho que aprender a falar portunhol logo E morar entre três fronteiras latinas é ideal Meu capulho já na metade  Me faz pensar que morar em Foz é ideal também para quem dá uma panca Pois é barato e verdinho Ajuda na redução de danos ...

serpente

Me encontro rastejando entre angústias  Sobre minhas escolhas Me obrigando a lembrar que tudo tem um preço Me encontro realizada em meus planos Com veneno das lembranças pingando em minhas presas Me obrigando a lembrar que para poder amar  Tive que sentir a dor da traição  Que para alcançar meu título  Tive que sacrificar o convívio com meu alicerce, minha família  Para ser respeitada tive que crescer até trocar de pele Um sonho também tem uma carga  Tanto para sonhar quanto para realizar. Nas entranhas mais escondidas de minha pele Só eu sei o que passei para rastejar até aqui  E o aqui é construído por experiências Que agora são lembranças Destacadas em um couro duro. Hoje sou uma serpente ansiã De cores opacas devido o tempo Lenta, até  Mas mais traiçoeira devido a maturidade.