Seu Zé
Julinha tinha penas 7 anos de idade naquela época, ela e seus outros 6 irmãos estavam brincando de polícia e ladrão. Eles corriam e pulavam na lama enquanto sua mãe plantava feijão. Enquanto Raimunda cavava os buracos e ponhava os feijões, Renato, seu filho mais novo, se aproximou gritando que Julinha tinha entrado em um lago e foi picada por uma cobra. Raimunda saiu correndo para ajudar a filha, mas quando chegou já havia se formado um pequeno poço de sangue ao redor do pé da menina. Raimunda arreganha os olhos assustada de preocupação com o que via. Isso não foi uma cobra que a picou. Primeiro ela arrancou um pedaço de tecido do vestido da Julinha e estancou o sangue. Depois jogou água para tentar ver a profundidade do corte. Raimunda percebeu que corte foi causado por um pedaço de vidro que estava jogado no lago. O corte era muito profundo e havia atingido uma veia, por isso Julinha perdeu tanto sangue. Aquele ano era 1979, na zona rural do sertão do interior do Ceará. O acesso à um hospital era difícil para aquelas condições de vida. Minha avó e meu avô viviam da agricultura e da pesca. Assim, a medicina tradicional dominava a maneira como cuidavam da saúde deles. Geralmente através medicamentos naturais e benzedeiras. Raimunda foi até meu avô Raimundo e falou que tinham que dar um jeito de levá-la no hospital, mas ele falou que seria uma viagem difícil para fazer aquele dia, por causa do calor do sol. Aquele esforço poderia piorar a situação. Amanhã de madrugada eles iriam. Minha avó então começou pensar forma para estancar o sangue. Ela então primeiro usou pó de madeira para estancar o sangue e depois uma vizinha ofereceu antibiótico, que por vez Raimunda colocou encima do ferimento. No dia seguinte o pé da minha mãe estava o dobro do tamanho. Nem adiantava levar para hospital para costurar. Estava infeccionado. Toda aquela tentativa de resolver o problema piorou em muito o estado de saúde da pequena Julinha. Minha mãe passou mais um mês engatinhando com a ferida aberta, pois não suportava andar por causa da dor da ferida infeccionada. Minha avó durante a noite, todo dia, rezava um terço no pé da rede de sua filha, e chorava que soluçava imaginando que aquela fatalidade causaria a morte de mais um de seus filhos. Ela já ti tinha perdido 7.
Deixe-me contar um pouco sobre aquele lugar. Era uma comunidade com algumas poucas casas de taipa distantes uma das outras. Era isolado e dificilmente aparecia algum rosto desconhecido, excerto raros ciganos que migravam com caravanas vendendo miçangas. Uma certa tarde ensolarada de domingo, no horário do almoço, minha avó avistou de longe um senhor. Ele era negro retinto de cabelo branco, suas roupas brancas amareladas pelo tempo. Ele caminhava na direção de sua casa. Devia estar com sede. Ele se aproximou, pediu água e perguntou se poderia descansar por lá até de tardezinha. Raimunda o ofereceu comida e armou uma rede pra ele no alpendre. Enquanto ele descansava, avistou Julinha e perguntou o por que uma criança daquela tamanho estava engatinhando. A vó o contou o que aconteceu. Então ele disse, vou rezar no pé dela de tardezinha antes deu ir embora. Horas depois o senhor pediu 9 folhas de pião e rezou 3 vezes no pé da garotinha. Quando ele terminou falou, tenho que fazer mais 3 sessões dessa na sua filha, mas pra isso preciso ficar na sua casa. No terceiro dia vou embora. Minha avó falou que o que eles comerem e beberem o senhor ia comer e beber também. No outro dia o pé de Julinha estava totalmente desinchado, apesar de que o corte ainda estava aberto. No segundo dia a ferida estava totalmente fechado e no terceiro dia minha mãe já conseguia andar, quando o senhor às três horas da manhã saiu para seguir caminho. Minha avó me falou que esse senhor apareceu do nada e sumiu do nada. Ela nunca mais ficou sabendo nada sobre aquele senhor. Ele foi o anjo da guarda da minha mãe, pois se não fosse por ele ela teria morrido. Minha avó é católica fervorosa, mas ela acredita em visagem. Falei pra ela que tenho certeza que quem salvou mainha foi seu Zé Pelintra.
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